Você já parou para pensar como a forma que as cidades são planejadas e organizadas pode influenciar o trânsito? Como as regras que definem o que pode ou não ser construído em cada área da cidade podem afetar a mobilidade, a qualidade de vida e o meio ambiente das pessoas que nela residem? Essas são questões que envolvem a legislação municipal de uso e ocupação do solo, um instrumento que regula as formas de uso do solo urbano, levando em conta aspectos como infraestrutura, paisagem, patrimônio e sustentabilidade. Neste texto, vamos analisar como essa legislação pode ter efeitos positivos e negativos sobre o trânsito, na perspectiva da população que nela reside, e quais são os desafios e as oportunidades para o planejamento e a gestão urbana.
EFEITOS POSITIVOS:
1. A legislação pode incentivar o uso de modos de
transporte sustentáveis, como bicicletas, ônibus e vans, por meio da definição
de zonas de restrição à circulação de veículos particulares, mas isso não é
suficiente se não houver uma oferta ampla de transportes coletivos e mais
sustentáveis, que atendam às necessidades e às preferências da população. Para
isso, é preciso criar ciclovias e faixas exclusivas para o transporte coletivo,
e integrar os diferentes modos de transporte. Isso pode reduzir o congestionamento,
a poluição e os acidentes de trânsito, além de melhorar a saúde e a qualidade
de vida da população. Por exemplo, se uma cidade de médio porte sem acesso a
trem e metrô, que possua uma legislação que limita o número de carros nas ruas,
incentiva o uso de bicicletas, ônibus e vans, e ofereça opções de integração
entre esses modos, pode facilitar a mobilidade dos seus habitantes, que podem
se deslocar de forma mais rápida, econômica e ecológica.
2. A legislação pode promover o adensamento urbano, ou
seja, a concentração de moradias, comércios, serviços e equipamentos públicos
em áreas próximas aos eixos de transporte, por meio da definição de Zonas
comerciais nos bairros onde já existem linhas de transporte coletivo. Isso pode
diminuir a necessidade de deslocamentos longos e frequentes, otimizar o uso da
infraestrutura urbana e estimular a diversidade e a vitalidade das áreas
urbanas. Por exemplo, se uma pessoa mora e trabalha em um bairro que tem uma
Zona comercial, ela pode ir ao trabalho, ao mercado, à escola, ao posto de
saúde, ao parque e a outros lugares usando apenas o transporte coletivo ou a
bicicleta, sem precisar pegar o carro e enfrentar o trânsito.
3. A legislação pode fortalecer o turismo de negócios,
educacionais e de serviços, fomentando a realização de atividades
profissionais, acadêmicas e de assistência médica na cidade, por meio da
definição de Zoneamentos que permitam a implantação de infraestrutura e
equipamentos adequados para receber eventos, cursos, congressos, hospitais,
clínicas e laboratórios. Isso pode gerar renda e emprego para a população
local, além de atrair investidores, estudantes e pacientes. Por exemplo, a
cidade pode aproveitar as regiões ao redor de hospitais, universidades, assim
como de polos que atraiam turistas, para oferecer Zoneamentos que incentivem a
construção de comércios, hotéis, centros de convenção, de modo a reduzir o
deslocamento dos turistas de forma mais pontual na cidade. Para tal é
fundamental que, para além da legislação de uso do solo haja um amplo acesso a
transportes coletivos, terrestres e aéreos de facilitem o acesso e a mobilidade
das pessoas que vêm à cidade para participar de atividades de negócios,
educacionais e serviços de saúde.
4. A legislação pode garantir o acesso à moradia digna
para a população de baixa renda, por meio da definição de zonas especiais de
interesse social, que permitem a regularização fundiária, a urbanização e a
construção de habitações populares em áreas adequadas. Isso pode reduzir o
déficit habitacional, a ocupação irregular e a segregação socioespacial, além
de melhorar as condições de mobilidade e de acesso aos serviços públicos para
essa parcela da população.
EFEITOS NEGATIVOS:
1. A legislação pode induzir a especulação
imobiliária, ou seja, a valorização excessiva dos imóveis em função da demanda
e da oferta, por meio da definição de zonas de maior potencial construtivo, que
permitem o aumento da densidade e da altura das edificações. Isso pode expulsar
a população de menor renda para áreas periféricas e distantes, situação que
caracteriza um processo de Gentrificação, aumentando os custos e os tempos de
deslocamento, além de agravar as desigualdades sociais e territoriais.
2. A legislação pode favorecer a implantação de
empreendimentos Industriais junto aos zoneamentos residenciais. Gerando um
conflito entre os diferentes usos do solo, que pode afetar o trânsito com
veículos pesados, como caminhões e carretas, que transportam as cargas e os
equipamentos desses empreendimentos. Esses veículos podem causar congestionamentos,
danos à infraestrutura viária, à segurança e ao conforto dos moradores, além de
aumentar as emissões de ruídos e poluentes atmosféricos, que afetam a saúde e o
bem-estar da população
3. A legislação pode gerar a dispersão urbana, ou
seja, a expansão da cidade para áreas distantes do centro, por meio da
definição de zonas de baixo potencial construtivo, que limitam a densidade e a
altura das edificações. Isso pode aumentar a necessidade de deslocamentos
longos e frequentes, sobrecarregar o sistema de transporte e gerar mais consumo
de energia e emissão de poluentes.
4. A legislação pode desconsiderar a acessibilidade
universal, ou seja, a garantia de que todas as pessoas possam se deslocar e
utilizar os espaços urbanos com segurança, autonomia e conforto,
independentemente de suas condições físicas, sensoriais ou cognitivas, por meio
da definição de zonas de interesse público, que permitem a implantação de
projetos urbanos que não respeitam as normas técnicas de acessibilidade. Isso
pode excluir e discriminar as pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida,
que podem enfrentar barreiras e obstáculos para se locomover e acessar os
serviços e equipamentos públicos.
CONCLUSÃO:
A lei de uso e ocupação do solo é um instrumento
importante para o planejamento e a ordenação do território urbano, mas também
pode ter efeitos positivos e/ou negativos sobre o trânsito, na perspectiva da
população que nela reside. Alguns efeitos positivos são: incentivar o uso de
transportes sustentáveis, promover o adensamento urbano, preservar o patrimônio
histórico, cultural e paisagístico, e garantir o acesso à moradia digna para a
população de baixa renda. Alguns efeitos negativos são: induzir a especulação
imobiliária, favorecer o uso do automóvel particular, desrespeitar o meio
ambiente, desconsiderar a participação popular, gerar a dispersão urbana e
desconsiderar a acessibilidade universal. Portanto, é fundamental que essa lei
seja elaborada, implementada e fiscalizada de forma participativa, transparente
e equitativa, buscando atender aos interesses coletivos e aos objetivos do
desenvolvimento sustentável.